A maioria dos cães que tem em casa é de raça indefinida, ou vira-latas. Os poucos de raça (12, ao todo) até somem em meio aos demais – é possível ver um rottweiler, alguns pinschers e outros poucos poodles. Os gatos, todos de raça indefinida, vivem em um espaço separado para evitar brigas.Como dona Ângela costuma dizer, “tem cães e felinos para todos os lados”: no quintal, na varada, na sala, nos quartos e até em parte da cozinha da casa.
Ela garante que todos têm nome. Aliás, o que não faltou foi criatividade para a escolha dos nomes: tem o Sabotagem, o Cascudinho, Cabeção, Boquinha, Zé, Morcego, Pandora, Nundo, Ceasa, Xerife e dezenas de outros mais.
O animal mais novo que Ângela tem em casa tem 15 dias; o mais velho, 10 anos. “Todos aqui são de rua. Tudo eu pego na rua. Uns com bicheira, outros atropelados, mutilados, uns vítimas de maus-tratos. Com isso, já são 22 anos de proteção animal”, diz.
Para alimentar os bichos, Ângela diz ser necessário 100 quilos de ração por dia e conta que tem dificuldades para comprar tanta comida para eles todo mês.
“Eu vivo de doações. Ganho dinheiro pedindo a um e a outro pessoalmente e na internet. Onde eu passo eu devo ração. Devo ali, devo acolá. Eu também fiz um grupo no WhatsApp e as pessoas me ajudam com a ração, mas não dá para o mês todo”, conta.
Ângela começou a recolher animais da rua no final dos anos 90, quando morava no bairro de Pirajá, em Salvador.
“Lá em Pirajá, eu comecei a pegar os da rua, mas o pessoal descobria e pedia a casa alugada de volta. Na última casa em que morei, no Conjunto Pirajá I, o dono se estressou, deu porrada no portão e botou todo mundo pra fora. Nesse tempo, eu já tinha 60 cachorros. Foi aí que eu decidi vim aqui para Lauro de Freitas. Morei um tempo de favor numa outra rua e depois achei esse espaço”, diz.
Ângela diz que muitas pessoas também passam hoje em frente à casa onde ela mora e abandona animais para ela cuidar. “As pessoas são miseráveis. Deixam aqui na minha porta, jogam por cima do muro. E foi assim que eu fui enchendo de bicho. Eu não tenho coragem de pegar e botar na rua ou deixar aí fora amarrado. Não tenho coragem”.
A mulher diz que somente uma vizinha já demonstrou incômodo com o barulho e até com o cheiro forte exalado pelos animais, mas afirma que conversa com todo mundo para “poder viver em harmonia”.
“Tem uma vizinha que reclamava às vezes do barulho de noite, mas nem tem muito assim. Eu controlo eles. Eles dormem presos, uns soltos e também nos informam quando vem gente estranha aqui na área. Eles latem”, conta.”Um dia teve um assalto aí e então ela não reclamou mais porque sabem que eles podem servir também para alertar”.A reportagem não encontrou a vizinha de dona Ângela para que ela pudesse falar sobre o caso.
Ângela afirma que quem quiser adotar algum dos animais pode entrar em contato com ela.
“Quando alguém aparece para adotar, eu faço entrevista, assino um contrato de vacina, porque não são vacinados, e pode levar. Se a pessoa não conseguir criar e cuidar, pode me devolver que eu aceito de novo. Às vezes eles latem demais, incomodam, e as pessoas que adotaram me devolvem”, diz.
Além de ração, Ângela também pede doação de remédios para os animais.
“Preciso de ração, de remédio para verme, remédio para bicheira, papelão para eles dormirem, jornal velho, toalha para dar banho neles. Tudo isso eu preciso para o dia a dia. Mas o principal mesmo é a ração. São 3 mil quilos por mês. O pessoal me ajuda, mas não dá para o mês inteiro. Eles começam a passar fome, ficam estressados e machucam uns aos outros e eu fico preocupada”, diz.
A moradora afirma que tem um sonho de montar uma ONG de proteção animal para também ter apoio de órgãos públicos para cuidar dos bichos.“Eu pago aluguel, pago luz, pago pessoas pra limpar a área, pra deixar limpo. Então, eu preciso mesmo de ajuda, de doações”, diz.Apesar das dificuldades, Ângela afirma que quer continuar a cuidar dos animais que tem e de outros que ainda possam aparecer.
“O pai dos meus filhos me disse uma vez que se eu ganhasse na loteria a gente iria viver viajando. Mas eu disse que não. Se eu estou na pobreza com meus cachorros, eu vou continuar com eles rica também. Não desfaço deles por nada. Tem um mesmo que está há 11 anos comigo. Então, eu crio amor. Eu sempre gostei de animais. É amor mesmo”.
Para ajudar Dona Ângela, basta entrar em contato por meio do telefone (71) 98812-5027, que também é número de WhatsApp.