O Ministério da Saúde anunciou ontem que pretende aplicar 22,9 milhões de testes do novo coronavírus pelo País. A promessa, porém, envolve produção acima da capacidade da Fiocruz, laboratório público responsável por fornecer boa parte dos exames. Outro obstáculo, dizem especialistas, é a compra de kits de diagnóstico no mercado internacional, onde já é difícil encontrar insumos para produzir esses materiais. O Brasil já registra 46 mortes e 2.201 casos confirmados pela doença.
A testagem em massa é considerada uma das medidas mais efetivas para identificar o avanço do vírus e criar estratégias de controle. Um exemplo de sucesso apontado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é a Coreia do Sul. O governo brasileiro afastava a possibilidade de exames em larga escala, mas passou a prever esse modelo desde o fim de semana.
Segundo o ministério, 5,6 milhões de exames estariam à disposição nos próximos cinco dias. O governo pretende agora intensificar a aplicação entre profissionais de saúde e de segurança, além de verificar casos graves e óbitos. A ideia é focar inicialmente cidades com mais de 500 mil habitantes, para conter maiores surtos. “Possivelmente o Brasil será um dos que vão registrar o maior número de casos, porque vamos testar muita gente”, diz Wanderson de Oliveira, secretário de Vigilância em Saúde da pasta.
Segundo ele, o Brasil precisará produzir de 30 mil a 50 mil testes por dia no período de pico do coronavírus. Hoje, a capacidade do Brasil é de cerca de 7 mil diários. A Coreia faz até 15 mil testes por dia. Até agora, foram cerca de 350 mil testes, em uma população de 51 milhões.
Do total previsto, 14,9 milhões de testes são os moleculares, ou PCR, que incluem a coleta de material no nariz e na faringe, com uso de cotonete. Esse teste demora mais tempo para ter o resultado conhecido, mas é preciso e mais seguro, conforme o protocolo da OMS. Outros 8 milhões de testes rápidos, que ainda precisam ter sua eficácia analisada e que devem ser usados na triagem de pacientes, também estão previstos para as próximas semanas.
Os dados de produção da Fiocruz indicados pelo ministério para fazer os kits estão além da capacidade de Biomanguinhos, fábrica da Fiocruz. A pasta afirmou que a fundação entregaria, até o dia 30, 2 milhões de testes moleculares, e mais 1 milhão em três meses. Ao Estado, Marco Krieger, vice-presidente de Produção e Inovação em Saúde da Fiocruz, evitou contradizer o governo, explicando que previsões de produção mudam a cada dia, mas informou dados mais modestos. Segundo ele, a produção inicial de kits de PCR em Biomanguinhos foi pensada para fornecer material para os 30 laboratórios de referência do País. “Estávamos falando, no começo da epidemia, de produzir, no máximo, 7,5 mil kits por dia, porque essa era a capacidade de execução dos laboratórios.” Até agora, foram entregues pouco mais do que 30 mil.
“Mas como casos cresceram muito em todo o mundo, e surgiram evidências científicas de que testes em larga escala trouxeram resultados, o governo começou esforço para aumentar a capacidade dos laboratórios”, diz. “Saímos de março, em que a expectativa era abaixo de cem mil testes, para entrar em abril, em que poderemos facilmente produzir até 500 mil durante o mês (no lugar de 2 milhões previstos pelo governo) e, quem sabe, com uma rede capaz de executar esses números.”
Paralelamente, segundo ele, a Fiocruz está negociando com três fornecedores a compra de 5 milhões de testes sorológicos, que avaliam a presença de anticorpos ao vírus no corpo. Esse material ainda não chegou e precisará ser validado antes de ser colocado à disposição. “O teste molecular é mais sofisticado. O sorológico é mais rápido e de mais fácil execução, o que descentraliza o serviço, mas tem a desvantagem de fazer uma detecção mais tardia da doença.”
Mas Krieger diz que ainda não é garantia de que todos os 5 milhões poderão entrar no sistema, pois dependem da validação. Isso é feito com a checagem de casos já identificados como positivos ou negativos. Ele afirma que unindo exames moleculares com os rápidos “é possível chegar aos números” anunciados pelo governo.
“Estamos falando de duas aplicações, dois custos e duas dificuldades diferentes de execução.” Krieger estima ainda que, com esse volume, será possível baratear os testes rápidos, de cerca de R$ 80 para em torno de R$ 20; e os moleculares, com aumento da escala de produção, de R$ 200 para menos de R$ 100. Segundo o ministério, a testagem em massa custaria ao menos R$ 436,4 milhões.
Paralelamente, o governo negocia a compra de mais 10 milhões de exames completos e espera doação de 5 milhões de testes rápidos prometida pela mineradora Vale. A Petrobrás anunciou doação de 600 mil . O governo sinalizou buscar testes no mercado internacional, mas tem dificuldades. “A Índia acabou de fazer bloqueio por 21 dias de todo o seu território. A China está com dificuldade de fornecimento de insumos. Fornecedores de máquinas não conseguem suprir o mercado internacional”, diz Oliveira
Correio da Bahia