in ,

Qual a relação de Vicente Pinzón e Mucuripe, no Ceará, com o ‘descobrimento do Brasil’?

Teses narram que navegador espanhol teria chegado ao Brasil antes mesmo de Cabral

Hoje, 22 de abril, é lembrado o aniversário de 522 anos da chegada da esquadra do português Pedro Álvares Cabral a Porto Seguro, na Bahia, marcando o que a história oficial chama de “Descobrimento do Brasil”. No entanto, outras correntes de estudo defendem que o espanhol Vicente Pinzón chegou ao Ceará meses antes, batizando o local de ancoragem como Cabo de Santa Maria de la Consolación.

Documentos históricos narram que o grupo de Pinzón desembarcou no dia 26 de janeiro de 1500. Divergências surgiram, no entanto, sobre a localização exata do Cabo. Para explicar a questão, o Diário do Nordeste consultou teses de doutorado e artigos do Instituto Histórico, Geográfico e Antropológico do Ceará, além de ouvir especialistas.

A partir de análises cartográficas, o almirante Max Justo Guedes indicou o “endereço” de chegada como a Ponta do Mucuripe, em Fortaleza. Essa tese também é defendida pelo historiador e diplomata brasileiro Francisco Adolfo de Varnhagen e pelo jornalista Rodolfo Espínola, outros pesquisadores do tema.

Já o intelectual cearense Thomaz Pompeu Sobrinho entendeu ser a Ponta Grossa, no município de Icapuí, no extremo leste do Estado. Por sua vez, o historiador Guarino Alves identificou o Cabo como a Ponta de Itapajé, na foz do rio Acaraú, no litoral Norte. Sob qualquer vertente, o local ficaria em território cearense.

Ainda que as suposições sejam defendidas com análises técnicas, o historiador Airton de Farias, doutor em História e professor do Instituto Federal do Ceará (IFCE), explica que a chegada do navegador ao Estado ainda é cercada de controvérsias.

 

“A chegada do Pinzón e de vários outros europeus antes da chegada de Cabral é questão que não tem a ver com o uso feito disso. O fato em si não tem implicações para a história do Ceará. Ele teria estado aqui, mas foi embora e ficou por isso mesmo”, observa.

 

Segundo o professor, o que ainda se pode discutir são os “usos de memória” sobre o episódio, como o batismo de um bairro da capital com o nome do espanhol e uma versão mais “bairrista”, regionalista, como mito de origem do Brasil.

“Concretamente, não teve desdobramentos sociais e econômicos para o Ceará: a terra não foi ocupada, não se tornou produtiva e não demarcou uma colonização do território. Para a formação do povo cearense, o efeito, a meu ver, foi nenhum”, analisa Farias.

 

Legenda: Retrato de Vicente Yáñez Pinzón pintado por Julio García Condoy (1899-1978)
Foto: Museo Naval/Centro Virtual Cervantes

 

A VIAGEM

Narra a historiografia que Pinzón zarpou de Palos de la Frontera, cidade do sul da Espanha, em novembro de 1499, rumo ao arquipélago de Cabo Verde, na África. De lá, as quatro caravelas comandadas por ele saíram em 13 de janeiro, enfrentando tempestades e neblina.

A data de 26 de janeiro defendida por vários pesquisadores também foi contestada por Guarino Alves, alegando ser impossível atravessar o oceano Atlântico em apenas duas semanas. Para ele, depois de se debruçar em mapas, o correto seria 26 de fevereiro – ou seja, com 45 dias de travessia.

O estudioso também sugeriu que o nome do local de aportada – Santa Maria de la Consolación – seria uma espécie de agradecimento (consolação) pelos navegantes encontrarem terra após tanto tempo e problemas no mar. Permaneceram por lá dois dias, mas não fizeram contato com indígenas nativos.

 

Após o primeiro desembarque, Pinzón seguiu para outra ponta do litoral cearense. Segundo Max Justo Guedes, a foz do Rio Curu, entre Paracuru e Paraipaba, teria chamado tanto a atenção do navegador que ele batizou a vista de “Rostro Hermoso” (rosto bonito), onde teria deixado uma cruz de madeira para marcar o território.

 

Os historiadores lembram que os espanhóis só não reivindicaram o território como de sua nação por força do Tratado de Tordesilhas, assinado entre Espanha e Portugal, em 1494. Uma linha imaginária dividiu o continente sulamericano em duas partes, cabendo à Coroa Lusitana tudo que estava a leste dela.

Assim, sabia Pinzón ter aportado em área fora do domínio espanhol. Por isso, seguiu viagem a fim de desbravar o Novo Mundo e encontrar especiarias e riquezas para a Coroa de Castela.

Legenda: População do bairro Vicente Pinzón está em torno de 50 mil pessoas
Foto: Natinho Rodrigues

 

OS BAIRROS

Independente dos detalhes, a história do navegador ganhou tanta relevância na capital cearense que acabou se tornando nome de bairro. Hoje, o Vicente Pinzón abriga cerca de 50 mil habitantes, segundo dados da Prefeitura.

Ele integra Grande Mucuripe, região marcada pela presença de pescadores artesanais; pela procissão de São Pedro e as quermesses da Igreja Nossa Senhora da Saúde; pelo Mirante do Morro Santa Terezinha, de onde se pode ver o litoral; e pelo Farol Velho, hoje bastante deteriorado.

QUEM FOI VICENTE PINZÓN?

Vicente Yáñez Pinzón nasceu em 1462, na cidade portuária de Palos de la Frontera, na Andaluzia espanhola. Era o mais jovem de três irmãos, e teria recebido o sobrenome do meio de Rodrigo Yáñez, funcionário da administração municipal espanhola que seria seu padrinho, como era costume na região.

Desde pequeno, aprendeu a arte de navegar com seu irmão mais velho, um dos mais destacados navegadores da época, e participou desde a adolescência em combates e assaltos naqueles tempos conturbados.

Casou-se duas vezes: a primeira com Teresa Rodríguez, com quem teve as filhas Ana Rodríguez e Juana González; e depois, com Ana Núñez de Trujillo, ao voltar de sua última viagem, em 1509. Viveu com ela em Triana, um bairro de Sevilha, até sua morte, em 1514.

Por Diário do Nordeste

 

 

Derretimento de geleiras bate recordes, alerta ONU

Dia da Terra: se o planeta fosse uma empresa, ela estaria quebrada