O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não iniciou nenhuma das 1.894 obras na área de educação cadastradas no Novo PAC (Programa de Aceleração ao Crescimento) Seleções —modalidade voltada a estados e municípios.
Os empreendimentos (escolas, creches e reconstruções de estruturas destruídas pelas chuvas no Rio Grande do Sul) somam um total de R$ 12,8 bilhões de investimentos previstos. Até o início de fevereiro deste ano, no entanto, nem um centavo havia sido pago pelo FNDE (Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação), órgão ligado ao MEC (Ministério da Educação).
Mesmo sem ter iniciado as construções, na última quarta-feira (12), o governo anunciou uma nova promessa de cerca de R$ 2 bilhões para mais obras (500 creches) dentro do PAC Seleções para educação.
O novo programa foi lançado no início do segundo semestre de 2023, e é uma das apostas do governo. A inauguração de escolas é também um objetivo do presidente Lula desde o início do mandato.
Questionados pela Folha, FNDE e Ministério da Educação afirmaram que “1.063 obras ainda não submeteram nenhum documento para análise” dos órgãos competentes.
O MEC disse que a nova etapa do PAC Seleções já estava previsto no calendário e contemplará municípios na Bahia, Ceará, Mato Grosso e Santa Catarina.
“Importante ressaltar que o Novo PAC envolve outros empreendimentos, em diversos eixos e modalidades, que não apenas o PAC Seleções, dentre eles outros projetos nas áreas de educação”, disse a Casa Civil.
A pasta, no entanto, não detalhou quantas, nem quais obras do Novo PAC para o setor estão fora da modalidade Seleções.
A Caixa, que é responsável pela análise da documentação das obras, afirmou que “realiza ações de assistência técnica com os recebedores”.
O Novo PAC retoma uma das principais bandeiras dos governos petistas anteriores, sob promessa de trazer investimentos e fazer girar e crescer a economia do país.
A Educação, pasta comandada por Camilo Santana, é uma pauta cara ao governo Lula, após a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ficar marcada por escândalos na área.
“A construção de creches, escolas de tempo integral e a modernização e expansão de Institutos e Universidades Federais são prioridades na educação. O programa vai impulsionar a permanência dos estudantes nas escolas, a alfabetização na idade certa e a produção científica”, afirmou o governo no momento do lançamento do Novo PAC.
Do investimento de R$ 1,7 trilhão previsto à época para todo o programa, a modalidade Seleções ficou com R$ 81 bilhões.
Pelo procedimento do programa, prefeitos e governos submetem empreendimentos ao governo federal, e cabe ao Ministério da Educação e à Casa Civil selecionar os escolhidos.
O FNDE então faz o empenho dos valores (etapa em que o dinheiro é separado para determinada finalidade, mas ainda não é pago), e a Caixa Econômica faz a análise da documentação recebida.
Se a empresa não encontra impedimentos, permite que os estados, municípios e o Distrito Federal abram um processo de licitação para a construção. Após definida a empresa vencedora, o fundo pode fazer o primeiro pagamento, que marca o início da obra.
Até aqui, a Caixa liberou apenas 387 projetos, ou menos de 20% do total de empreendimentos, para o processo de licitação. A primeira autorização foi em agosto de 2024. O banco alega que recebeu apenas 781 projetos para analisar.
O FNDE empenhou apenas R$ 2 bilhões dos quase R$ 13 bilhões previstos para investimento. Do total de obras, 1.096 são creches e 610 são escolas —62% das estruturas compreendem educação infantil e 36%, de tempo de tempo integral.
A maioria dos projetos está na Bahia (156), Pernambuco (140) e no Ceará (133), estado do ministro Camilo Santana.
Pessoas que acompanham o tema apontam, sob reserva, alguns problemas que podem explicar o cenário.
Além do processo burocrático ser complexo, a capacidade das equipes municipais para elaboração do projeto por vezes é baixa, sobretudo em cidades pequenas.
A própria estrutura técnica do governo federal muitas vezes é insuficiente em comparação com a demanda de análises.
Além disso, parte dos recursos deveria vir por emendas, mas o setor não é priorizado pela maioria dos parlamentares.
Este último ponto é ressaltado por Claudia Costin, presidente do Instituto Salto e ex-diretora global de educação do Banco Mundial.
Ela afirma que as emendas parlamentares pulverizam o orçamento da União e reduzem a solidez das políticas públicas, o que resulta na interrupção de projetos em andamento e na falta de continuidade de propostas.
“Isso tira a capacidade de se fazer uma política educacional sólida”, afirma.
A paralisia das obras se dá em um momento em que Lula vem cobrando que seus ministros apresentem resultados, já tendo em vista as eleições de 2026 —a promessa do Novo PAC é que a esmagadora maioria dos investimentos seja feito até lá.
“A entrega que nós fizemos para o povo ainda não foi a que nós nos comprometemos a fazer em 2022, porque muitas das coisas que nós plantamos ainda não brotaram”, disse, na primeira reunião ministerial do ano, no final de janeiro.
Segundo o petista, o momento não é para novos programas, mas sim para execução dos que já existem.
Essa não é a primeira vez que programas de infraestrutura educacional do governo apresentam problemas.
Em abril de 2024, a Folha mostrou que, das quase 4.000 obras do Pacto pela Retomada —promessa de Lula para reiniciar empreendimentos paralisados em gestões anteriores—, nenhuma havia recomeçado, mesmo após um ano do lançamento da iniciativa.
Atualmente, 880 já estão autorizadas a iniciar a nova licitação e 272 foram concluídas, segundo dados oficiais.
Paulo Saldaña e João Gabriel/Folhapress