Valor foi liberado ao longo de maio e equivale a 81% dos recursos já compremetidos para pagamento em 2023. Parte das liberações ocorreu após derrota do governo na Câmara nos decretos do marco legal do saneamento.
O governo federal liberou para pagamento, ao longo dos primeiros dias de maio, R$ 1,3 bilhão em emendas parlamentares, segundo dados do Siga Brasil. O valor é equivalente a 81% dos recursos que já foram compretidos para distribuição em 2023.
Tecnicamente chamada de chamada de empenho, a liberação para pagamento significa que o recurso está reservando aquele valor para posterior pagamento.
Ou seja, na prática, o Executivo está se comprometendo com aquela despesa. A maior parte desses recursos, porém, ainda precisa ser efetivamente paga.
Os recursos são de emendas de bancada partidárias e individuais — que são impositivas, isto é, o governo é obrigado a pagar — e de indicações feitas por comissões do Congresso.
A autorização desse montante acontece em meio a novas ofensivas do governo para realinhar apoios no Congresso Nacional e críticas dos parlamentares sobre o descumprimento de acordos (veja mais abaixo).
Uma das críticas por parlamentares era justamente em relação à demora em disponibilizar o pagamento de emendas parlamentares. Esse tipo de recurso é previsto no Orçamento e cabe aos deputados e senadores indicar ao governo os locais nos quais serão aplicados.
Em um sinal de desgaste, na última semana, a Câmara aprovou a derrubada de trechos dos decretos sobre saneamento básico editados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Apenas nesta quarta-feira (10), quando ministros do governo se reuniram com as bancadas do PSB e do PSD, que também contribuíram para a derrota do Planalto na última semana, foram autorizados R$ 433,5 milhões. Desse valor, foram disponibilizados:
- R$ 397,1 milhões para deputados;
- e R$ 36,4 milhões para senadores.
Chefe da articulação política do governo, o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) afirmou nesta quinta (11) que o “ritmo de empenho está seguindo absolutamente o que estabelece a Lei de Diretrizes Orçamentárias”.
“É mais do que legítimo que os parlamentares façam indicações de investimentos que o governo federal realizará. É necessário, é democrático e é importante para as políticas públicas. Não se pode criminalizar nem burocratizar a política”, escreveu em publicação nas redes sociais.
Além dos recursos comprometidos para pagamento ao longo de maio, cerca de R$ 300 milhões foram liberados para pagamento desde o início do ano.
Distribuição das emendas
Até o momento, R$ 1,6 bilhão foi autorizado para pagamento. A maior parte foi destinada para a Saúde (R$ 1,1 bilhão).
O PT foi o partido com mais recursos reservados. Em seguida, aparecem três siglas com ministérios no governo (PSD, União Brasil e MDB):
- PT: R$ 197,2 milhões;
- PSD: R$ 156,9 milhões;
- União Brasil: R$ 147,8 milhões;
- MDB: R$ 144,7 milhões;
- e PP: R$ 118,6 milhões.
Na distribuição das emendas atribuídas a cada congressista, os recursos autorizados somam R$ 1,32 bilhão.
Por ano, cada senador tem direito a indicar R$ 59 milhões em emendas individuais e cada deputado, R$ 32 milhões.
Dos recursos liberados até agora, a maior parte foi destinada a deputados (aproximadamente R$ 1 bilhão).
Os cinco parlamentares que mais receberam, no entanto, foram senadores:
- Mara Gabrilli (PSD-SP): R$ 28,2 milhões;
- Daniella Ribeiro (PSD-RN): R$ 23,3 milhões;
- Jayme Campos (União-MT): – R$ 16,8 milhões;
- Renan Calheiros (MDB-AL): R$ 16,2 milhões;
- e Jaques Wagner (PT-BA): R$ 15,6 milhões.
Além deles, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também é um destaque: R$ 11 milhões em indicações feitas por ele já foram liberadas.
Do lado da Câmara, o presidente Arthur Lira (PP-AL) ainda não teve nenhum montante autorizado.
Derrotas no Congresso
O empenho recorde de emendas vem na esteira da tentativa do governo de consolidar uma base de apoio no Congresso após derrotas em votações de interesse do Planalto no plenário da Câmara.
Na quarta-feira (3), deputados votaram para derrubar as alterações feitas pelo presidente Lula no marco do saneamento. Essa foi considerada a primeira grande derrota do governo no Congresso.
Na votação, 295 parlamentares votaram contra o governo, incluindo deputados de partidos que ganharam ministérios na gestão Lula, como MDB e PSD.
O líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), reconheceu que o acordo com os deputados não vinha sendo cumprido e considerou a pressão dos parlamentares “legítima”.
“Afora essa derrota que tivemos por pressão legítima dos parlamentares, porque os acordos que tínhamos feitos não estavam sendo cumpridos, desde a PEC da Transição que a liberação das emendas etc e tal e dos cargos [estava atrasada], mas acho que a coisa volta à normalidade”, disse.
Nova regra fiscal e reforma tributária
O governo tem se empenhado para organizar a base no Congresso, em especial na Câmara dos Deputados. Por lá, passarão os desafios para aprovar, ainda no primeiro semestre, a reforma tributária e o novo marco fiscal.
A avaliação é que, com os textos, será possível alcançar a estabilidade das contas públicas em um cenário de aumentos de despesas para estimular o crescimento econômico.
O relator do novo marco fiscal, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), deverá apresentar seu parecer na próxima semana. É necessário, no mínimo, o apoio de 257 deputados e 41 senadores para aprovar a matéria.
Já a reforma tributária tramita em um grupo de trabalho da Câmara. O texto, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), exige votação favorável de, no mínimo, 308 deputados e 49 senadores.
Recursos disponíveis para 2023
O Orçamento da União reserva R$ 36,5 bilhões para as emendas parlamentares em 2023.
Apesar de parte ser de execução obrigatória (individuais e de bancada), o Executivo pode liberar os recursos ao longo do ano.
Em geral, o governo tende a autorizar o pagamento das emendas nos momentos em que precisa fortalecer o apoio no Congresso.
Até o momento, não houve empenho das chamadas “emendas pix”. Nesse tipo de recurso, os valores são enviados pelo governo federal diretamente ao caixa dos municípios ou dos estados, sem indicação para os recursos.
Há ainda um outro tipo de “emenda”, dessa vez em um formato informal. No ano passado, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou as emendas de relator — apelidadas de “orçamento secreto” — inconstitucionais, cerca de R$ 10 bilhões foram direcionados para gastos discricionários do Executivo.
Apesar de ser um recurso formalmente do governo federal, parlamentares cobram as indicações desses valores, também como forma de garantirem apoio no Congresso.
Na prática, esses recursos foram “herdados” do orçamento secreto e também se tornaram uma espécie de emenda, porém de difícil rastreio.
Segundo técnicos, como esses recursos entram como despesas discricionárias, eles se misturam a outros gastos de escolha do Executivo.
Por isso, não é possível diferenciá-los das demais despesas no Orçamento e o Siga Brasil não consegue identificá-los.
Por Elisa Clavery, Luiz Felipe Barbiéri e Pedro Figueiredo, TV Globo, g1 e GloboNews — Brasília